«Travessuras da menina má», por Mario Vargas Llosa

Não é difícil compreender que Mario Vargas Llosa tenha sido, em 2010, galardoado com o Prémio Nobel da Literatura. Afinal, não é fácil escrever sem cerimónias, com crueza, genuinidade e, ao mesmo tempo, tanta emoção - três ingredientes difíceis de juntar sem cair no cinismo, ou nas fábulas utópicas e francamente irrealistas. Assim, Vargas Llosa presenteia-nos com a mais completa obra que já li acerca do amor: aquela que não ilude mas, na sua desnudez, continua a ser essencialmente bonita.

"Travessuras da Menina Má" dá-nos a conhecer Ricardo, Ricardito ou "Menino Bom" que é, fundamentalmente, isso mesmo: um menino com boas intenções e poucas ambições, que se apaixona por uma menina ainda na sua mocidade e por ela fica doente de amor por toda a sua vida. O enredo leva-nos a acompanhá-lo de Perú, seu país-natal, a Paris, onde sempre sonhava viver e onde passa grande parte da sua vida, numa cronologia de encontros e desencontros com a sua sempre amada "Menina Má". Esta menina enche-lhe a vida de travessuras e abandonos cruéis, proporcionando-lhe fogosos momentos de paixão e felicidade, para depois o deixar na ruína emocional e, também, financeira. Acompanhar Ricardito nesta viagem é sentir constantemente o coração aumentar e diminuir a sua frequência, como quem vai numa montanha-russa emocional. O que mais me agradou neste livro foi exatamente isso - ter-me proporcionado experienci
ar tantas emoções distintas e tão pouco intervaladas. Gosto de livros que me façam empatizar pelas personagens vilãs, pois acredito que na natureza humana aquilo que, muitas vezes, distingue o vilão do herói é somente o contexto e a perspetiva. Por isso, o facto de ter empatizado e até simpatizado com a "Menina Má" confirma que esta é uma grande narrativa e, sem dúvida, uma das mais belas histórias de amor que já li.

Deixo-vos as palavras do próprio autor acerca deste livro, que resumem de forma brilhante a sua essência:

"(Ela) Sente um tipo de amor, ainda que nada romântico. O amor é algo muito interno, que não se pode explicar. Os românticos diziam que o amor era um puro movimento das emoções, e tampouco se pode explicar como uma sublimação do instinto sexual. No amor há algo mais, é algo estranho, algo que implica tudo o que é a condição humana: o instinto, o sexo, a paixão e também o espírito e certos fantasmas do inconsciente que, desde logo, se despejam num tipo de relação que revela o melhor e o pior das pessoas. Neste romance tratei de fazer uma exploração do amor desligado de toda a mitologia romântica que o acompanha sempre, uma mitologia que a nossa época desmente na prática, mas que ainda não referimos na hora de falar do amor. O amor dela não é um amor romântico, mas também é amor.


Avaliação: 4/5

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